(Assista um vídeo sobre Chi Kung no final deste post!)
Aqui
venho relatar alguns pontos importantes da minha experiência com esta prática
conhecida como Qi Gong (lê-se Tchi-kun) ou Chi Kung, em sua variante do sistema
Easy Tao (Tao Fácil), que me foi apresentada em Porto Alegre, RS, pelo Mestre
Wu Guang Jie (Richard), fundador do sistema Easy TAO®, presente na Europa,
Antilhas e América do Sul.
Chamou-me a atenção uma
afirmação de Richard (seu nome ocidental). Ele contou-nos
que aprender a sentir e a manipular a assim chamada energia vital para nosso
benefício é bem mais simples do que muitos podem acreditar no início. Segundo
aproximadamente suas palavras, alguns alunos perguntam a seus instrutores: “Quando vou começar a
sentir a energia?”, e alguns falsos mestres respondem: “Depende. Talvez venha a
sentir a energia daqui a uma semana, ou um mês, ou um ano, ou talvez nunca." O
que na verdade isto significa? Que o referido “mestre” simplesmente não sabe o
caminho.
Eu concluí que a essência do Chi Kung está em aprender a sentir e a conduzir a energia vital para o nosso
equilíbrio e saúde, e para o desenvolvimento e o despertar de nossas capacidades naturais. Chi significa energia e kung significa arte ou trabalho. Uma interpretação livre do termo poderia ser
“a arte de conduzir e utilizar eficientemente (ou sabiamente) a energia”.
Em seu curso, Richard utilizou exemplos práticos, como por exemplo, o exercício “Expulsando as 100 mil
doenças”, demonstrando a necessidade de localizarmos as tensões ou bloqueios da energia em nosso corpo, e liberá-los.
Admirável foram as
explicações sobre o essencial significado das forças duais que
existem em nosso universo. Devo dizer que nunca em
todas as minhas pesquisas e estudos anteriores eu havia compreendido tão bem o
significado da força positiva e negativa da natureza, o feminino e masculino
cósmico, o afirmar e o negar, ou, em outras palavras, a necessidade do equilíbrio entre o fazer e o não
fazer, entre a tensão e o relaxamento, o descanso e a ação, ou ainda, como é
denominado mais tradicionalmente no oriente, o YING E O YANG.
Em toda ação, é necessário
certa passividade, e em todo descanso, é necessário uma certa ação. Assim, ying
e yang não apenas se complementam, como um contém o outro. A compreensão disso é muito importante, já que no Chi Kung vamos trabalhar tanto com a energia positiva (yang) quanto com a negativa (ying).
Para que o aluno tenha uma percepção mais intensa da energia, o Chi Kung utiliza o movimento e a ação, unindo-o
estes elementos à intenção e à imaginação, e também à respiração. A prática de
todos estes elementos em conjunto torna mais fácil sentirmos o chi. Para exemplificar isto, Richard fez uma demonstração, através de um
pequeno exercício. Primeiramente, deveríamos imaginar que estávamos colhendo a maçã de uma árvore, sem expressar nenhum movimento. Depois, novamente imaginávamos a mesma ação, contudo,
desta vez movimentando o corpo, erguendo a mão e colhendo a maça imaginária. O
resultado deste exercício: a presença da maça se torna ainda mais
palpável quando o praticante atuar também com o corpo.
Geralmente a respiração é
utilizada no Chi Kung como um meio de concentração e também como um auxiliar para a ação e
o movimento. Contudo, Richard alertou que seria melhor não a usarmos pelo menos no
início, pois existia o perigo de criarmos tensões no corpo devido a uma
urgência ou ansiedade de utilizar este recurso. Contudo, à medida que o aluno se
acostuma a sentir a energia e a relaxar os pontos de tensões no seu corpo, ele já estará mais apto a usar sua respiração para auxiliá-lo.
Nos vários exercícios que fizemos para
movimentar a energia, utilizando movimento e imaginação, senti que tinha um
grande destaque e importância a imagem da árvore. Realizamos várias atividades
que tinham como base esta ideia. Encostávamos-nos a uma árvore imaginária,
fazendo movimentos em relação à ela. Também devíamos nos sentir como a própria
árvore; realizávamos uma série de movimentos tendo como base a sensação de que
éramos este elemento da natureza. Os
braços movimentam-se como os ramos das árvores ao vento. Os pés tem uma forte
ligação com a terra, onde penetram as raízes. Neste trabalho de abraçar uma árvore
ou sentir-se como uma árvore, busca-se o contato direto com as duas conexões principais da
energia (o yang, positivo, que sugere a ação, e vem do céu, e o ying, negativo,
que acolhe, e vem da terra).
Durante as atividades, Richard auxiliava,
orientando-nos como deveríamos movimentar partes do corpo, ou em que posições
mantê-lo durante o movimento, para que os canais de passagem da energia não fossem interrompidos ou bloqueados.
E assim, por meio de um trabalho regular com vários elementos, unindo a ação com imagens - inclusive a ideia da árvore - seguindo orientações de como posicionar partes o corpo
para não bloquear a energia, fazendo-se
consciente das tensões para desfazê-las, vamos sendo guiados a perceber o
chi e a trabalhar sobre ele.
Outro ponto essencial do
curso que eu não poderia deixar de citar é o trabalho para o equilíbrio interno e para a defesa energética do nosso corpo.
Richard demonstrou como podemos utilizar para
esta finalidade certos pontos de entrada e absorção da energia presentes na
palma de nossa mão. Após o aluno aprender a sentir e deslocar o chi, ele poderá retirar excessos de energia do corpo, ou ao contrário, concentrar em um órgão ou região enfraquecida mais energia. Para isto, realiza-se um movimento espiral da mão em determinada ponto do corpo,
partindo do centro para a periferia, assim deslocando e retirando a energia
presente naquela região. Ou, ao contrário, o aluno poderá iniciar o movimento
em espiral da mão partindo da periferia para um ponto central e específico do
corpo, deslocando e concentrando a energia ou chi naquele local.
A partir da
expansão do movimento em espiral da mão, sensações emocionais desconfortáveis,
ou nocivas, como medo, ódio, podem ser deslocadas de regiões do corpo como o peito
e transformadas, reaproveitadas, transformando-se em força para os ossos. As
energias e sensações nocivas também podem ser lançadas para o sol ou para a
lava no centro da terra.
Na sequencia do trabalho com
a energia, aprendemos que o princípio da utilização do chi para uma luta
marcial ou para equilibrar ou curar o corpo é o mesmo, mudando apenas o
enfoque. Tudo depende da nossa intenção e de como direcionamos o chi.
Por exemplo, ao se defender
de um golpe com o braço, manifestamos o chi ou energia para fora, para o
exterior. Contudo, este mesmo movimento pode ser invertido, projetando ou
conduzindo a energia para o interior, protegendo algum órgão ou reforçando-o.
Richard nos conduziu em alguns exercícios em duplas, onde nós interagimos, com
golpes e movimentação, que tinham alguns objetivos determinados, como, por exemplo, utilizar a energia sabiamente,
adquirir reflexos e desenvolver as duas áreas do cérebro, fazendo-as agir em
conjunto, com movimentos que exigiam atenção e a ação paralela de ambos os
lados do corpo. Tivemos a demonstração de como deslocar ou derrubar um “oponente” sem
esforço, utilizando o próprio movimento do outro para derrubá-lo. Da forma semelhante, explicou
Richard, é possível se libertar de sensações ou energias negativas, não
resistindo a elas exatamente, mas deixando-as fazerem se percurso e ajudando-as a percorrer nosso sistema, conduzindo-as para fora do corpo em seguida. Para uma sensação desagradável ou
energia negativa que se agarra com muita força ao nosso organismo, Richard
recomendou que utilizássemos a imagem e a ideia da árvore, com suas raízes
cravando-se profundamente no solo. Assim, criando em nosso corpo um fluxo de
energia ying (negativa), deslocaríamos imediatamente o que estaria nos
perturbando para dentro da terra.
Nos dois dias de curso, foram dados muitos
exercícios e movimentos, dos quais admito que não foi possível lembrar todos. O
interessante disto, porém, foi o que Richard nos contou: “O mais
importante de tudo é a intenção e a compreensão de como trabalhar ou movimentar
a energia”. Assim, mesmo que um movimento não ocorra exatamente como foi
demonstrado, se a intenção estiver correta, a energia irá agir. Simplificar é o essencial. Desconfio que este foi o motivo principal pelo qual Richard batizou seu sistema de Easy Tao (Tao Fácil).
Tive mais de
uma experiência que comprova a eficácia do método. Contarei agora uma delas. Havia dormido até tarde e
acordei sentindo certo mal estar. Ainda sonolento, lembrei-me do Chi Kung e fiz
alguns movimentos com os braços e mãos, imaginando que a energia nociva era
retirada do meu corpo e lançada na direção do sol além do meu quarto. Depois
dormi novamente. Sonhei que estava deitado de costas para o alto e alguém fazia
aplicações de energia em mim com as mãos. No sonho, algo escuro saiu de meu
corpo e afundou no chão, até mergulhar na lava, no fundo da terra. Acordei me
sentindo melhor.
Outra pessoa que participou
do curso contou-me que também aplicou com sucesso algumas técnicas. Ela
sentia-se cansada e com um mal estar. Em seu local de trabalho, sentou-se em
uma cadeira e imaginou as raízes da árvore afundando na terra. Conseguiu
perceber que algo pesado e negativo realmente saiu dela, descendo por sua coluna, na direção do solo.
Pelo que percebi, todo o
trabalho do Chi Kung em torno de imagens – principalmente a da árvore – é de vital importância, pois ensina
o aluno a alcançar o equilíbrio de si, auxiliando-o na integração entre o movimento do corpo, a ação e a percepção da própria energia. Entre outros aspectos, a imagem da árvore
permite ao praticante se conectar tanto ao chi do céu quanto ao chi da terra, e assim buscar o equilíbrio entre estas duas forças, tanto na prática, quanto em seu dia a dia.
Neste momento lembro do poeta e teatrólogo francês Antonin Artaud, cujas ideias
sobre o teatro exigiam que o homem alcançasse um corpo novo, livre de doenças e
de reações falsas, mecânicas. No fim de
sua vida Artaud representou este corpo liberto do homem em um poema utilizando a imagem de uma
árvore. Acredito ser pertinente finalizar este post com alguns trechos do seu texto.
Saiba mais sobre Antonin Artaud, clicando aqui!
O Homem-Árvore
(Carta
a Pierre Loeb)
Antonin
Artaud
O
tempo em que o homem era uma árvore sem órgãos nem função,
mas
de vontade
e
árvore de vontade que anda,
voltará.
Existiu,
e voltará.
Porque
a grande mentira foi fazer do homem um organismo,
ingestão,
assimilação,
incubação,
excreção,
o
que existia criou toda uma ordem de funções latentes e que escapam
ao
domínio da vontade decisora,
a
vontade que em cada instante decide de si;
porque
assim era a árvore humana que anda,
uma
vontade que decide a cada instante de si,
sem
funções ocultas, subjacentes, que o inconsciente rege.
(...)
Quero
dizer alguns homens.
Animais
sem vontade nem pensamento próprio,
ou
seja, sem dor própria,
que
em si não aceitam vontade de uma dor própria
e
para forma de viver mais não encontraram que falsificar a humanidade.
E
da árvore-corpo, mas vontade pura que éramos,
fizeram
este alambique de merda,
(...)
causa
de peste e de todas as doenças
(...)
Um
dia o homem era virulento,
só
era nervos elétricos,
chamas
de um fósforo perpetuamente aceso,
mas
isto passou à fábula porque os animais lá nasceram,
(...)
e
a vida mágica do homem caiu,
(...)
ARTAUD,
Antonin. Eu, Antonin Artaud. Lisboa: Hiena Editora, 1988, p. 105-110.
ANEXO:
Richard explicou no curso que a imitação de movimentos baseados em animais tem como objetivo potencializar a energia destes no corpo do praticante, gerando diversos benefícios, conforme a espécie escolhida. Por exemplo, uma cobra auxiliaria na cura de doenças ligadas a sexualidade; a imitação de um urso geraria força e confiança... Abaixo segue um vídeo com movimentos de animais, com o praticante de Chi Kung, Wu Dang.
ANEXO:
Richard explicou no curso que a imitação de movimentos baseados em animais tem como objetivo potencializar a energia destes no corpo do praticante, gerando diversos benefícios, conforme a espécie escolhida. Por exemplo, uma cobra auxiliaria na cura de doenças ligadas a sexualidade; a imitação de um urso geraria força e confiança... Abaixo segue um vídeo com movimentos de animais, com o praticante de Chi Kung, Wu Dang.
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